sexta-feira, 27 de julho de 2012

SP: Quintas (68)

RELENDO COM A ALMA ARREBITADA


Naturalmente que leio vários livros ao mesmo tempo. Um para o Metrô, um para o amanhecer, e assim por diante. Faço de meu prazer uma novela, é a estética da leitura que o cotidiano me impôs. E agradeço por isso, pela chance de transformar minha vida numa doce disciplina.
Comecei a ler, novamente, após tantos anos, o “Narizinho Arrebitado”, do Lobato. Como ler um livro de Lobato é o mesmo que ler um de Jorge Amado, ou seja, um acontecimento extraordinário em nossas vidas, de fácil e vibrante felicidade... cá estou. No meu caso, felicidade indisfarçável. Ponho-me num sorriso largo, na largura das letras.
Impressionante como Monteiro conseguiu pôr no papel a peraltice das crianças, a algazarra de doçuras.
Esse livro, Reinações de Narizinho, eu tomei emprestado da “Gibilândia”, a Gibiteca que as crianças formaram e que por falta de amplas doações de gibis, está virando uma Livroteca.
A peraltice encantadora das crianças, quando Lúcia se refere às pedras negras do limo, como “Tias Nastácias do Rio”. Lobato teve esse toque de genialidade, algo que foi alcançado por Andersen, quando transformou caixas de fósforos, pequenos objetos e brinquedinhos, em Literatura de imortal encantamento.
Como aprendi a dividir a felicidade quero escrever um pouquinho sobre esse “Narizinho Arrebitado”. Só um pouquinho. Estou celebrando um acordo de cavalheiros com o tempo.
De fato, no Natal de 1920 as crianças receberam um presente extraordinário quando esse livro surgiu. E Lobato trouxe para a mente fecunda e ensolarada da criança, os doces da Tia Anastácia, trouxe também o Gato Félix para o sítio da Dona Benta, que se tornou o sítio de todas as crianças. Dona Benta, a “Vovó mais feliz do mundo”.
Dependendo de certa ótica, certo prisma, hoje, ao observar todos os dependentes tecnológicos atuais, as nossas crianças sem avarandados, penso e ouso afirmar o óbvio: nenhuma criança deveria, jamais, passar a infância sem ler um livro de Monteiro Lobato.
Lobato, que tão magistralmente soube interpretar a oralidade, que em sua época era a tradução da alma, do espírito da época, como sempre será.
O que mais me surpreendeu é que na minha idade eu possa me emocionar e sentir tanta alegria diante de seu texto. Ou estou virando menino novamente ou desde aquele dia, naquela tarde fria quando em minhas mãos segurei o primeiro livro desse autor, estava condenado a crescer de forma lobatiana.

Marciano Vasques

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