terça-feira, 10 de abril de 2012

PR: Heliana Grudzien é entrevistada por Danilo Marques



Heliana Grudzien é entrevistada pelo ilustrador Danilo Marques.

Danilo Marques: Oi, Heliana, depois de visitar o blog “Vento Revirado” e revirar seus trabalhos aos quatro ventos, além de  quase pedir licença e sair do mercado, também fiquei muito curioso com algumas coisas muito legais... Primeiro parabéns por tudo, pela sua formação, pelo seu empenho, pelo profissionalismo, capricho, criatividade e história.
Heliana, conte um pouco sobre a sua infância no interior, esta expressão “infância no interior” quando chega aos meus ouvidos (no caso aos olhos, rs) causa um efeito muito maior do que a expressão apresenta; eu imagino uma criança correndo livre como a poesia “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu, quando ele conta que ia descalço, de camisa aberta correr atrás das borboletas, que era livre filho das montanhas e etc. Fico fascinado imaginando. Conta um pouco disso e a relação dessa infância e os desenhos, livros, lápis coloridos e blocos de papel que você menciona ali no blog... Aproveitando a parte biográfica, fale como foi seu inicio como ilustradora profissional.

Heliana Grudzien: Danilo, as palavras evocam imagens. Ilustrei-o, Gigante, belo e forte.
A sua imaginação pousou no cenário exato da minha infância. Cenário de dias felizes. De coisas simples que adquiriram para mim uma significação eterna. A minha cidade, no interior do Paraná, por si só possuía mil encantos. Tinha rio com cachoeiras e chalanas. Tinha mata, mato, matinho. Tinha montanhas e vales. Tinha gente simples. Tinha festa,  com sinos e procissões, comidas e doces tradicionais. Tinha sossego, tinha paz. Tinha meus avós, meus tios, meus primos, minhas irmãs. Tinha minha mãe italiana adornando meus cabelos, com coloridos laços de fitas.  Minha casa era uma casa polonesa, de madeira pintada de azul com janelas e  lambrequins brancos. Eu adorava ver a chuva caindo dos lambrequins. Uma bela e confortável varanda, onde trepadeiras floridas exalavam nos ares seus perfumes, completava a sua arquitetura.  Eu sentia o maior orgulho dela. Tinha jardim, horta, pomar, cercados e galinheiro. Tinha cachorro, vaca, um veadinho chamado Bambi, galinhas com nome de gente, e um galo chamado Franjão. Tinha gato, papagaio, coelhos e cachorros, mais de um. O “mais de um” era o meu companheiro inseparável Cauby. Tinha borboletas, abelhas que faziam mel, besouros e libélulas. E para completar a minha felicidade, tinha muitos bem-te-vis e  outros  pássaros. Muitos pássaros. Pronto. Chega. Vêm lágrimas por aí...

Agora, você pode continuar imaginando o resto da minha “infância no interior” Uma polaquinha que vivia solta como o vento. Ventando pra todo lado. Vento revirado...rsrsrs... risos...
 Meu pai, filho de imigrantes poloneses, assim como o poeta, também era Casimiro. Foi o meu maior incentivador. Com que enternecimento ele admirava os meus desenhos! Ao voltar do trabalho, não raras vezes, trazia em suas mãos generosas, coloridas caixas de lápis, blocos de desenho e livros. Eu sentava na varanda e desenhava sem parar. Os desenhos iam surgindo como num passe de mágica. Desenhava de tudo. Flores, bichos, casas, árvores, gente...  Mas os meus modelos preferidos eram os pássaros. Eles povoavam o meu imaginário infantil e despertavam em mim a vontade de flutuar, de voar sobre o meu mundo de criança, montada em suas asas.  E continuam hoje, muito presentes   em todos os meus trabalhos de arte.

Comecei a ilustrar e a escrever profissionalmente  quando retornei  ao Brasil, depois de quatro anos de estudos na Polônia.

Danilo Marques: Você tem formação na faculdade de belas artes do Paraná e nas academias de Cracóvia e Varsóvia. Como é estudar no exterior? Como foi essa experiência e o que você pode passar para nós? Compartilhe conosco um pouco do que você adquiriu lá.

Heliana Grudzien: Depois da  Belas, onde me formei em Pintura, ainda cursei Arquitetura. Mas o vento revirou. Sofri um grave acidente de trânsito e não conclui o curso. Lá se foram cinco anos para a recuperação do corpo e da alma. Foi nesta época “agridoce” que desenvolvi algumas séries de desenhos sobre ecologia. Eram  desenhos de  grandes formatos, elaborados  a lápis de cor. Trabalhava como formiga, sem pretensão de nada. Produzia sem parar, para esquecer o trauma do acidente que havia sofrido.  Mas o vento soprou novamente a meu favor. Vendi quase tudo que produzi. Sacudi as asas, pleiteei uma bolsa de estudos e voei pra Polônia, pátria dos meus avós. 

A Polônia foi para mim um divisor de águas, tanto na carreira como na vida.  Fui de um jeito, e voltei de outro, em todos os sentidos. Morei com uma família polonesa, aprendi muito sobre o idioma, cultura e  tradições.  Fiz especialização em Gravura em Metal, Cartazes Culturais, Ilustração de Livros e também frequentei o Atelier de Conservação e Restauração de Obras de Arte em Papel/Livros na Biblioteca Nacional de Varsóvia. Todavia o fascínio que exerceram sobre mim os artistas gráficos poloneses, em especial os designers de cartazes, foi indescritível. Deles eu emprestei e trouxe para o meu trabalho, o gosto pelo improviso no trato gráfico e a liberdade de expressão. Capacitei-me no uso de materiais alternativos/descartáveis/lixo na feitura dos meus trabalhos de pintura/ilustração/livros.
Atualmente ministro oficinas onde  capacito  crianças das Escolas Públicas de Curitiba e do Paraná no uso de material alternativo.

Danilo Marques: Você venceu o 9º International Book Art Festival Correspondence 2012-2014 POLÓNIA, com um livro objeto, feito com materiais diversos, destacando rolhas de garrafas de vinho, usando letras do alfabeto, símbolos, signos números  e palavras pequenas. Parabéns. Nos conte do livro e dessa conquista.

Heliana Grudzien: Na Polônia os livros de arte fazem muito sucesso. Uma grande plêiade de artistas dedica-se a esta modalidade de arte visual e literatura. Em Lodz, uma cidade situada mais ao centro da Polônia, assim como a Escola de Cinema, ela também é famosa pela Escola de Livros de Arte. Essa  Escola, equivalente ao ensino superior, é uma verdadeira oficina/laboratório de magia. Ali são produzidos livros que encantam e instigam adultos e crianças. Para tanto os artistas fazem uso dos mais diferentes e inusitados materiais. O Festival Internacional de Livros de Arte no formato de trienal é muito concorrido. Dele participam artistas do mundo inteiro. Em todas as suas edições, o referido festival lança um tema – nesse último, o 9º Festival, do qual participo, o tema é “Correspondência”. Para minha alegria e surpresa, meu trabalho, um livro objeto, levou um dos prêmios do júri. 
A proposta do trabalho que apresentei é  de interação com o público que visita ou visitará as exposições itinerantes que acontecerão no decorrer de três anos,  em cidades polonesas e fora delas. Usei 78 rolhas de garrafas de vinho com pegadores de madeira. Nelas esculpi caracteres, como letras, números, símbolos, palavras. Coloquei-as em pequenas repartições dentro de uma caixa de madeira de formato oval, bem como, tintas e almofadas de carimbo e folhas soltas brancas de papel.  O título do livro é “Correspondências” ou WRITE ME. Ele faz  um  convite  ao público,   que utilize as folhas de papel  em branco e  carimbe mensagens para mim. O vinho é a celebração do encontro de um final que fatalmente será um “grande final” – A AMIZADE!!!

Danilo Marques: Fale um pouco do seu processo de criação... o que usa, como faz para aqueles trabalhos ficarem tão ricos em efeitos... além do trabalho eclético que possui, com cada livro adquirindo uma característica, sendo ilustrados de formas diferentes e sempre muito caprichosas.

Heliana Grudzien: A capacitação no uso de materiais alternativos que adquiri das Escolas Polonesas de Artes Gráficas e Restauração de Obras de Arte em Papel foi fundamental para o meu processo de criação. A liberdade do improviso e a paciência são os ingredientes que  uso na realização dos meus trabalhos de arte/ilustrações e literatura.  Como eu mesma ilustro meus próprios livros, tenho muita liberdade para elaborar as imagens. Além de dominar várias técnicas artísticas, elaboro a maioria das ilustrações com pinturas. Desenho direto sobre o jornal, com tinta, a maneira gestual. Daí por diante vou limpando os excessos. Os efeitos finais são aqueles a que você se refere na sua pergunta.  Uso de tudo. Tintas diversas, pós dos mais variados, até produtos de maquiagem. Tudo muito louco... rsrsrs
Quanto aos livros que escrevo na maioria deles trabalhei primeiro as imagens e depois o texto. Gosto de trabalhar desta maneira, porque as imagens são geralmente pinturas em grandes formatos  que inspiram o texto. São ecléticos, porque cada novo livro pede uma nova metodologia diferenciada no trato gráfico, linguagem etc. 
Acho,  que é por aí...///// rolo no canto/rolo no meio/rolo  no jardim inteiro/enfeito-me com as flores/ de todos os canteiros. 
Muito obrigada, Danilo! Felicidades e muito sucesso, prosperidade e realização para você também!


Postado há 10th April 2012 por Marilza Conceição

Nenhum comentário:

Postar um comentário